janeiro 30, 2012

A FALTA DE HOMOLOGAÇÃO DE EQUIPAMENTO NA ANATEL, AFETA O ESPAÇO AEREO.


Câmera de Vigilância Interfere em Radar da Aeronautica.

Por Edgard Pakes.

Chegou ao escritório regional da Anatel em São Paulo um comunicado da aeronáutica solicitando, com a máxima urgência a eliminação de fonte de interferência na frequência de 1090 MHz, que é utilizada pelo radar secundário localizado na Avenida Sapopemba 19988.

Tal urgência se dava pelo fato da interferência ser visualizada na tela daquela estação como um borrão em todo o setor compreendido entre os azimutes 274° e 278°.
Estação Radar

Para melhor compreender este caso de interferência, cabe aqui explicar, embora superficialmente, sobre os sistemas de radar e de sua complexidade.

Radares dos tipos primários e secundários são utilizados pela aeronáutica para a localização e obtenção de dados de vôo, respectivamente, das aeronaves que voam em espaço aéreo controlado.

O radar primário opera em frequência única de 1015 MHz e sua função é determinar a distância das aeronaves em relação à posição da estação radar.

Para isso, envia pulsos eletromagnéticos de curta duração na ordem de MW (Megawatts) e recebe os ecos destes pulsos.

Conhecida a velocidade de propagação da onda eletromagnética (c=300.000 Km/s) e o tempo entre a transmissão de um pulso e a recepção de seu eco (t), a distância é então determinada (e=c*t/2).

Diferente do radar primário, o radar secundário opera nas frequências de 1030 e 1090 MHz.

Sua função é obter a altitude e a identificação das aeronaves, entre outros dados de vôo.

Para isso, transmite um código digital de interrogação na freqüência de 1030 MHz para as eronaves, nas quais o equipamento transponder recebe, decodifica esta interrogação, gera uma resposta codificada com as informações requisitadas e transmite para o radar secundário em 1090 MHz.

As antenas destes radares são rotativas, direcionais, de altíssimo ganho e feixe muito estreito.

Seus lóbulos de irradiação principais tem a forma de um cone que se abre em direção ao alvo.

Apesar de funções diferentes, as antenas dos radares primário e secundário são co-localizadas umas sobre as outras girando simultaneamente no mesmo eixo.

Isso possibilita a sincronia das informações obtidas por ambos os sistemas numa mesma tela de monitoramento.

Ou seja, o controlador de vôo visualiza as informações de posição ao lado dos dados da aeronave (altitude, prefixo, companhia, velocidades horizontal e vertical, etc.).

Um sistema integrado, composto por várias estações radar, possibilita a cobertura de um grande espaço aéreo, pois o alcance de uma única estação radar é limitado.

O resultado desta composição forma o controle de tráfego aéreo de uma região.

O tratamento deste caso de interferência foi iniciado de imediato e a equipe de fiscalização foi até a estação radar interferida com a Unidade móvel de Radiomonitoragem – UMR.

Basicamente, a UMR é uma van, cujos equipamentos embarcados se destinam a realização de análise espectral e identificação da direção de origem dos sinais radioelétricos (radiogoniometria).

Na análise espectral observamos apenas a presença de rajadas de sinal características da emissão dos transponders, das aeronaves em tráfego na região, fato este que dificultava a investigação.

Considerando que a antena do radar estava a mais de 30 metros de altura, fomos até o topo da torre com um analisador de espectro portátil e uma antena diretiva, mas nada constatamos.

Como a direção do sinal interferente em relação à antena do radar era conhecida e sua recepção era constante, optamos em utilizar a própria antena do radar secundário para a monitoração da possível fonte interferente.

Com o auxílio de dois sub-oficias da aeronáutica, rádios comunicadores e analisador de espectro conectado ao guia de onda da antena, rotacionamos manualmente a antena até próximo dos azimutes informados.

Ao meu comando pelo rádio, os sub-oficiais fizeram um “vai-e-volta” com a antena e pudemos então visualizar uma portadora constante e de características diferentes dos sinais dos transponders.

Apesar da baixa intensidade desses sinais, foi possível identificar que estava presente ali um sinal de vídeo em 1087 MHz invadindo a extremidade de frequências mais baixas da janela de 6 MHz de recepção do radar secundário.

Ajustamos o analisador para demodular vídeo e áudio e conseguimos uma imagem, embora sem sincronismo horizontal.

Nenhuma informação audível foi percebida.

No dia seguinte, retornamos a estação radar com a UMR, o analisador de espectro e outra ferramenta que nos auxiliou muito.

Uma rota sobre a qual deveríamos passar produzida em papel com imagens selecionadas no Google Earth, partindo da estação radar e seguindo no azimute 276°.

Até o final da tarde, sem nenhum sucesso, já havíamos percorrido 2 Km sobre a rota.

“Costurar” toda a região, em baixa velocidade, em lugares de difícil acesso com uma van de três toneladas é muito complicado.

De retorno ao escritório da Anatel, seguimos atentos na monitoração do espectro.

Foi então que passando por um ponto da Avenida Sapopemba percebemos pela primeira vez por um breve instante que o analisador de espectro ficara sensível a um sinal, que logo desapareceu.

Pairava a dúvida se era o que procurávamos.

No dia seguinte, retornamos a este local e lá reiniciamos a radiomonitoragem.

Pelo acostamento da avenida a unidade móvel foi lentamente manobrada e tivemos a felicidade de visualizar e manter um sinal no espectro, inclusive com indicação de direção no goniômetro.

Naquele mesmo instante decidimos seguir para a direção indicada, embora quase às cegas, pois assim que iniciamos o deslocamento perdemos o sinal.

Fazendo a triangulação com a rota traçada pelo Google Earth e a direção apontada pelo goniômetro, concluímos para onde deveríamos ir.

Em questão de pouco mais de duas horas avançamos o suficiente para captar um sinal constante na tela da UMR, embora sem visualizá-lo no analisador.

Enfim, para nossa alegria, conseguimos uma imagem no analisador de espectro.

Era um portão de rua e entrada de garagem que estava sendo monitorado.

Não havia mais dúvida quanto nossa suspeita. Estávamos próximos de encontrar a fonte interferente.

O goniômetro apontava para o centro de um quarteirão, mas enquanto circulávamos tentávamos encontrar o tal portão que víamos na tela do analisador.

Enfim, percebemos que a residência a qual buscávamos não estava na rua, mas sim numa pequena viela para dentro do quarteirão.

Para positivarmos, outro servidor da equipe de fiscalização foi até a frente da residência suspeita para que eu pudesse visualizá-lo na tela do analisador.

Câmera que interferia no Radar

Devido o comprometimento da interferência, a estação de radar não estava operando e neste caso voltamos ao local pela manhã do dia seguinte.

Assim que chegamos à residência, fomos atendidos pela moradora, que logo se prontificou em chamar seu marido, o qual havia instalado a câmera, mas que não se encontrava lá.

Já na presença dele, relatamos a interferência e o grau de gravidade, pois se tratava de interferência prejudicial com risco a vida.

O proprietário do equipamento se prontificou em desligá-la, embora não acreditando na possibilidade de que sua “inofensiva” câmera estivesse interferindo num sistema tão complexo como o radar, e de que estávamos rastreando o sinal por quatro dias.

Enquanto procedíamos com a lacração do equipamento e elaboração do auto de infração, contatamos o setor de telecomunicações da aeronáutica e solicitamos que se verificasse o desaparecimento da interferência.

Um sub-oficial que se encontrava na estação radar confirmou que o borrão havia desaparecido.

A potência do transmissor desta câmera de vigilância era de 50 mW (isso mesmo, 50 miliwatts!) conforme verificada no selo do minúsculo equipamento.

A faixa de frequências de operação varia entre 900 MHz e 1200 MHz.

0 alcance obtido pelo receptor que o acompanha, não passa de 200 metros.

A antena utilizada era um monopolo vertical conectado no próprio transmissor.

A altura que o equipamento estava instalado era em torno de 2,5 metros.

Tal transmissor de vídeo e áudio não certificado e não homologado pela Anatel, foi comprado no mercado eletrônico de São Paulo.

A pessoa que o comprou e o instalou, apesar de demonstrar um conhecimento técnico, desconhecia o potencial ofensivo daquele equipamento.

Sua pequena potencia poderia ter causado danos irreparáveis, pois afetava o Controle do Espaço Aéreo.

A estação radar interferida dista aproximadamente 5500 metros do local onde estava instalada a câmera de vigilância.

A lição que aprendemos deste artigo é de que devemos estar atentos ao adquirir qualquer aparelho que irradie rádio frequência, seja uma simples câmera de vigilância, seja uma simples babá eletrônica, que embora ainda não se tenha verificado que interfira em radar aeronáutico, foi por vezes constatado que interfere na telefonia celular.

Existem equipamentos no mercado que podem ser adquiridos e utilizados com tranquilidade.

Tais equipamentos são aqueles que estão em conformidade com as normas brasileiras e devem obrigatoriamente ser homologados pela Anatel.

Em caso de dúvidas, sempre é bom consultar o site da Anatel no link “produtos certificados e homologados”. Restando ainda dúvidas, é só ligar 1331 ou se dirigir até o escritório mais próximo da Anatel.
Tela do analisador de espectro: Sinal interferente e sinais de transponder
Edgard é Técnico em Regulação de Serviços Públicos de Telecomunicações.

Atua no SGME – Sistema de Gestão de Monitoramento de Espectro do Escritório Regional da Anatel de São Paulo.

OBSERVAÇÃO:

Este mostra a importância da homologação de equipamentos junto a Anatel, e que tão importante quanto a homologação, é que compremos, na medida do possível, somente equipamentos que sejam homologados, principalmente se estes transmitem algum tipo de sinal de RF.

@SAC.TEC-CHARLES-N.FRIBURGO/RJ

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